quinta-feira, 17 de janeiro de 2019

Auto-retrato



Era pelas palavras que ela se revelava
mas era também a escrita que lhe concedia
um esconderijo: cada poema era um espelho
e um muro.

Em cada diálogo anunciava-se um encontro
possível, mas o rosto que a definia
não era madrugada nem horizonte pelo que
o coração lhe pulsava como um túmulo
onde a solidão ia ocupando 
o seu lugar.

Cada verso escrito era, assim, um pátio
e um exílio: cobria-se de uma camada
de silêncio cada vez maior até que
um dia restará apenas, sobre a mesa
onde só ela se sentava junto ao mar,
essa película tão sensível quanto inerte
que, afinal, era a sua pele.

[Sandra Costa]

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