sexta-feira, 6 de abril de 2018

Epigrafia #4

Carl Vilhelm Holsøe

Penélope

«Desfaço durante a noite o meu caminho.
Tudo quanto teci não é verdade,
Mas tempo, para ocupar o tempo morto,
E cada dia me afasto e cada noite me aproximo.»

Sophia de Mello Breyner, Coral

Junto à luz tardia da janela, esperas.
Não és Penélope nem Helena.
Não teces verdades nem mentiras,
não vagueias nem te deitas,
não te espantas nem esqueces.

Junto a essa janela, pousas o cotovelo
no parapeito da tarde que tudo cobre e esperas.
E o que se afasta é o que se aproxima.
O que regressa é o que ecoa.
O que se deslassa é o que corrói.

Junto às sombras que são agora a janela,
o teu olhar, por fim, espera.
Nem Ulisses, nem Páris.
Nem o amor, nem o desejo.
Nem o silêncio, nem um poema.

Apenas o instante em que um coração
imóvel deixa de bater por ti.

[Sandra Costa]

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