«Nunca soube
escrever poemas de Natal. Se alguma vez cogitei escrever um, cedo pressenti que
respiraria sempre o medo de cercar esse tempo de uma imaterialidade que
acabaria fatalmente por o destruir.»
Jorge Pinho,
Dezembro de 2019.
Poema de Natal 2.0
Eu também nunca soube escrever
poemas de Natal.
Convoco vocábulos e imagens
como se fossem
antigas, alguém escreveu há
dias «minúsculas», histórias
de amor, mas quase sempre há
nessas composições
mais silêncio que alegria,
mais penumbra que luz,
mais inquietude ou solidão que
o ritmo do mundo
a movimentar girândolas de
vida.
Abeiro-me dos telhados
inclinados das vigílias,
dos musgos dos muros da
infância que cobriam
as nossas mãos de firmamento, dos
descampados
onde florescem os bardos que vacilam
com o vento,
mas sobre os meus cabelos as
guirlandas são
de errância e já não deixo os
pés descalços junto
da lareira à espera de
milagres.
Eu também
não sei escrever poemas de Natal
e é por
isso que reconheço que tudo o que é matéria
do sensível
pode cobrir este tempo de raízes,
trazendo-nos
esse lugar que há em todos nós
onde ainda
o amor, e já não o medo, é possível.
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