terça-feira, 29 de agosto de 2017

Exercício 2.0 #7

«Trop naïf.», inexplicavelmente, a sua voz soara clara.
«Pardon?»
«Trop naïf.», não se recordava em que língua continuaram a falar. «Foi assim que me caracterizaram o primeiro quadro de Vollotton que vi. Era Premiers rayons
«Não conheço.», a voz dele tinha um timbre que lhe agradava, grave ainda que austero, mesmo quando era um lamento. A primeira qualidade física de um homem, para ela, era sempre a voz, mas não percebia porque tivera, ali, aquele pensamento, quando nem sequer tinham, ainda, trocado um olhar.
«Gostei tanto que fui procurá-lo para saber onde se encontrava exposto. Não o encontrei por pertencer a uma colecção privada mas foi assim que fiquei a conhecer Villa Flora.»
«Visitou-a?»
«Sim. Vim de lá ontem. Tenho imensa pena que todos estes quadros não estejam mais lá.»
«Eu também. Felizmente, ainda os pude ver no seu ambiente natural.»
«Sim?»
«Sim. Este estava na antiga Biblioteca, mesmo ao lado do salão principal.», com um leve movimento corporal, pelo canto do olho parecera-lhe um levantar do queixo, indicara-lhe o quadro que estava à frente deles. «É um quadro maravilhoso mas lá tinha um outro encanto. Vim confirmar isso hoje.», o suspiro que ouvira seria real ou imaginado?
«Também trazia um plano?», encarava-o pela primeira vez.
«Um plano?», a pergunta ou o seu olhar apanhara-o desprevenido, assim julgava ela, que via naquela hesitação dele um primeiro sinal de submissão. Tontaria dela.
«Eu elaborei um plano para esta visita. Passei primeiro por Winterthur, onde visitei a casa e o jardim. Falei com várias pessoas ligadas a Villa Flora e aos Hahnloser. Apropriei-me da história deles o mais que pude.», fazia pausas. «Queria aqui entrar com o espírito de lá. Até tomei um café revolucionário, eu que nem gosto especialmente de café!», sem querer, floresceu-lhe nos lábios um pequeno sorriso, enquanto lhe dizia aquilo tudo. Quem se submetia a quem?
«Compreendo. Eu também trazia um plano.», ele fitava, de novo austero, La Blanche et la Noire, de Félix Vallotton.
«Convido-a para jantar?», nem ela nem ele (pensara ela) ousaram, de imediato, perceber se a pergunta tinha sido mesmo formulada ou fora apenas um pensamento dele.

[The end]

[Sandra Costa]

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