«Trop naïf.»,
inexplicavelmente, a sua voz soara clara.
«Pardon?»
«Trop naïf.»,
não se recordava em que língua continuaram a falar. «Foi assim que me caracterizaram
o primeiro quadro de Vollotton que vi. Era Premiers
rayons.»
«Não conheço.»,
a voz dele tinha um timbre que lhe agradava, grave ainda que austero, mesmo
quando era um lamento. A primeira qualidade física de um homem, para ela, era
sempre a voz, mas não percebia porque tivera, ali, aquele pensamento, quando
nem sequer tinham, ainda, trocado um olhar.
«Gostei tanto
que fui procurá-lo para saber onde se encontrava exposto. Não o encontrei por
pertencer a uma colecção privada mas foi assim que fiquei a conhecer Villa
Flora.»
«Visitou-a?»
«Sim. Vim de lá
ontem. Tenho imensa pena que todos estes quadros não estejam mais lá.»
«Eu também. Felizmente,
ainda os pude ver no seu ambiente natural.»
«Sim?»
«Sim. Este
estava na antiga Biblioteca, mesmo ao lado do salão principal.», com um leve movimento
corporal, pelo canto do olho parecera-lhe um levantar do queixo, indicara-lhe o
quadro que estava à frente deles. «É um quadro maravilhoso mas lá tinha um
outro encanto. Vim confirmar isso hoje.», o suspiro que ouvira seria real ou
imaginado?
«Também trazia
um plano?», encarava-o pela primeira vez.
«Um plano?», a
pergunta ou o seu olhar apanhara-o desprevenido, assim julgava ela, que via
naquela hesitação dele um primeiro sinal de submissão. Tontaria dela.
«Eu elaborei um
plano para esta visita. Passei primeiro por Winterthur, onde visitei a casa e o
jardim. Falei com várias pessoas ligadas a Villa Flora e aos Hahnloser. Apropriei-me
da história deles o mais que pude.», fazia pausas. «Queria aqui entrar com o
espírito de lá. Até tomei um café revolucionário, eu que nem gosto
especialmente de café!», sem querer, floresceu-lhe nos lábios um pequeno
sorriso, enquanto lhe dizia aquilo tudo. Quem se submetia a quem?
«Compreendo. Eu
também trazia um plano.», ele fitava, de novo austero, La Blanche et la Noire, de Félix Vallotton.
«Convido-a para
jantar?», nem ela nem ele (pensara ela) ousaram, de imediato, perceber se a
pergunta tinha sido mesmo formulada ou fora apenas um pensamento dele.[The end]
[Sandra Costa]